terça-feira, 23 de setembro de 2014

A arte de acordar

Quem me conhece ou já dormiu comigo( falo dormir comigo pensando no lado bom da coisa e não do que a sua imaginaçãozinha fértil deve estar visualizando) sabem : eu odeio acordar cedo e quem me acordar cedo, merece todo o meu desprezo e rancor. Não consigo também acordar sozinho, se já é ruim o simples fato de ter que acordar cedo, sozinho é quase que impossível isso acontecer. Acho que já devo ter contado isso algumas vezes, mas vale frisar, quem me me acorda é a minha mãe, então lá pelas tantas do início da manhã, minha delicada mãe, pronuncia meu nome abreviado Edu... acorda filho. É bom escutar a voz dela, aliás é a certeza de que vencemos mais um dia, mais um dia de vida nos foi concedido, eu ela, ela e eu. Mas por outro lado, sei que vem chumbo grosso pela frente, essa voz dela também me chama para a realidade, realidade de estudos, de trabalhos, de provas, de freelas, de isso e aquilo e aquilo outro. É complicado mon'amour é complicado. 
Odeio profundamente a criatura infernal que criou o sistema de vinte e quatro horas e finais de semana, por mim, seria semana apenas dois dias e o resto, seria tudo de descanso e lazer e conversas na beira de estradas ou fim de festas em postos de gasolina,  sair com amigos, ler Marçal de Aquino ou um guia de uma cidade que você quer muito conhecer, mas não! Não é assim que acontece, não é assim que esfola um bode, não é assim que a banda toca.
A banda toca de outro jeito, com outras obrigatoriedades e complicações e responsabilidades e compromissos e deveres e blá blá blá. Acordar cedo é um insulto, uma deformidade, uma calamidade. Eu me sinto até injustiçado pelo simples fato de acordar e dizer: " mas já, eu deitei agorinha pouco para dormir e já tenho que acordar", isso é chato, é ruim. Na época de colégio, acordava para ir para aprender as palavras paroxítonas, proparoxítonas e oxítonas, hiatos, dígrafos, adjuntos adverbiais e nominais e outros assuntos, não queria nada disso, queria apenas praticar a palavra oxítona mais bonita que eu acho: dormir, com sílaba tônica no i, para dar mais ênfase no sono profundo. 
Quando estou dormindo não tem telefonema, não tem fogo, não tem tiroteiro, não tem plantão televisivo, fofocas, nada, nadinha me acorda do meu estado de hibernação. Durmo, sonho, às vezes sim, às vezes não, deito, fecho os olhos e entro na máquina do tempo e clico em retroceder dois anos, ou apenas dois meses. Isso sim que é legal. 
Agora no lugar de ir à escola, vou para o jornal, para a faculdade, para compromissos adultos, para conversas mais sérias, para críticas mais verdadeiras, para a realidade, e mesmo assim, com essa idade que tenho, ainda continuo intacto nesta situação, acordar cedo é uma arte, uma arte para os fortes, que assim como eu tentam e muitas das vezes, conseguem driblar esse vilão, o sono. 




Eduardo Sousa 



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